sábado, 5 de junho de 2010

O DESERTO


O deserto não faz parte da realidade brasileira. Nós conhecemos os desertos dos filmes, das novelas, dos livros, das fotos... A nossa relação com a areia, fica mesmo por conta das belas praias que temos ao longo de toda a costa brasileira. Mas aqui no México, o deserto é presença real e constante. Todos os mexicanos sabem contar uma história que se passou no deserto.
Atravessar o deserto a pé, é o maior obstáculo a ser vencido por milhares de imigrantes ilegais, que anseiam deixar para trás uma América pobre e ingressar em uma nova vida, em uma América rica. E são eles oriundos de todos os países da América do Sul e da América Central.
Apenas três horas de caminhada, separa o sonho; do “paraíso”, mas o percurso pode ser um pesadelo e a chegada é sempre incerta.
Este deserto atende pelo nome de “ALTAR”, e eu divaguei neste nome. - Ora, altar é um lugar de sacrifícios. Sacrifício é sofrimento. Sacrificar-se é perder a vida. Sacrifício rende-se a deuses e a demônios. Nenhum sacrifício traz consigo uma garantia de êxito. –
E concluí que nenhum outro nome poderia ser mais apropriado que este, para nomear este deserto.
Ninguém se arrisca a cruzar o deserto sozinho. Para este pleito, contrata-se um “coyote”* e a “aventura” ocorre em bandos de 20 pessoas, em média.
O deserto Altar está localizado bem ao norte do México, e é uma das regiões mais inóspitas do mundo. É o lugar mais quente do hemisfério norte. Ouvi falar em até 47 graus à sombra. Por isso, várias pessoas morrem de insolação, ou desidratação durante a travessia. Mas estes não são os únicos problemas a serem enfrentados, há que se enfrentar a fome, o medo, a guarda fronteiriça, o cansaço, os animais peçonhentos, o risco de um mal estar, o risco de perder-se, o risco de ser abandonado pelo grupo, a espera (Porque a distância é de 3 horas de caminhada, mas com a presença da guarda, há que se esperar a hora certa de avançar. Isso pode durar 6, 8, 10, 15... horas)...
Este deserto tornou-se o pano de fundo do sofrimento de muitas famílias que perderam um, ou todos os seus filhos. Perderam pais, sobrinhos, amigos, cônjuges...perderam a alegria de viver, perderam a fé.
Semana passada eu vi no tele-jornal, um pai chorando sobre o corpo morto do seu filho, que morreu enquanto os dois tentavam cruzar a fronteira. Hoje ele apareceu mais uma vez na TV. Tinha em suas mãos, uma caixa com as cinzas do filho e estava pedindo ajuda para retornar ao seu país. E eu me pergunto: ele vai entregar a caixa para a mãe do rapaz, dizendo; eis aqui o teu filho.???
E o que pensar da história de uma mãe salvadorenha (de El Salvador), que vivendo já nos Estados Unidos e querendo trazer as filhas de 10 e 12 anos, pagou 2 mil dólares a um coyote pela travessia das meninas, as quais nunca chegaram lá?
Mas este é apenas “um lado” do deserto e logo vou contar-lhes outro.

*coyote – sujeito que tem por atividade lucrativa, atravessar pessoas ilegalmente, pelo deserto. (Essa é a minha definição. Se alguém souber uma melhor, favor dividir conosco).

- Músicas inspiradas nesta temática: Pobre Juan – Maná; Mojado – Ricardo Arjona ; Pa’l Norte – Calle 13.

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